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segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Tarsky

Não sou um "dog lover", no sentido de quem gosta de todos os cães incondicionalmente e coloca os seus direitos ao nível, ou acima, dos direitos das pessoas.

Mas também não gosto lá muito de pessoas. Gosto de algumas pessoas, tal como gosto de alguns cães.

Mas todos os boxers que vejo - nem são assim muitos que andam por aí - lembram-me um certo cão.

Um cão que me faz relembrar como pode ser uma ligação entre um cão e um homem.

Tarsky era um cão que ressonava e tinha sonhos agitados. Um cão que suspirava, que fazia olhos de enfado. Um cão que vi amuar, num dia que o repreendi injustamente. Acredito que sejam assim todos os cães, ou talvez tenham, tal como nós, as suas idiossincrasias, dependendo não apenas da raça, mas do indivíduo cão, cada qual com a sua unicidade.

Tarsky era, portanto, tão único como eu sou único. Era um boxer peculiar, com cauda, sem as orelhas cortadas. E que bonitas era aquelas carnudas orelhas. É um crime cortar as orelhas a um boxer. Gostava tanto das orelhas do Tarsky que cheguei mesmo a trincá-las - eu, que sou um TOC misofóbico, mas não conseguia resistir àquelas aveludadas orelhas de cão. 

Não apenas a sensação do tacto, mas também do olfacto. Sobretudo do olfacto.

Resumindo, não sou dog lover, mas o que gostava mais no meu cão era o cheiro a cão.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Lista de compras

Foi mais um até já, um até logo. Como muitos, já foram tantos, são cada vez menos, mas parece que custa cada vez mais.

Calhou-me a mim desta vez o papel de partir, coisas da nossa profissão. E tu deste-me boleia, levaste-me à estação.

Subi à plataforma. Esperei pelo comboio que me levaria ao aeroporto. Tu voltaste para o automóvel que me trouxe a bom porto e vi-te partir, toda olhos aguentando as lágrimas e eu feito de nós apertando cá dentro. Seria fugaz a ausência, ambos sabíamos. Mais uma, apenas, e por uma semana, mas há coisas da história, feridas feitas de distância, que nos torna intolerantes aos momentos de partida. Somos como que os dois átomos de uma molécula de oxigénio.

“Falta o ar quando nos separamos” penso, expirando o ar baço da boca, levo a mão ao bolso do casaco de Inverno, que faz tempo que não uso, porque já não me lembro de um frio como este a abater-se sobre Lisboa. “Imagino como estará em Dijon”.

E eis que sinto um papel amarrotado dentro do bolso, quando já o placard da estação avisa que vai entrar na linha 1 o alfa pendular.

Retiro a bola de papel, desembrulho-a. É uma lista de compras escrita nas costas de um recibo de pagamento por multibanco. Uma lista antiga, claramente escrita quando estávamos algures no estrangeiro, ou quando estávamos juntos por cá, num inverno distante.

Irrompe o alfa pendular, enquanto leio a nossa lista de compras:
 
- Morangos
- Natas
- Seven Up
- Champanhe
- Batatas
- Ovos
- Iogurte grego
- Azeitonas

Coisa estranha. “Morangos no inverno? Champanhe? Que iriamos festejar? Ou, a avaliar pelo Seven Up, deveria ser para uma sangria de champanhe: seria?”. Não sei, é uma lista esquisita. Sei lá realmente onde estávamos quando escrevi este rol de compras.
Entro no comboio, encontro o meu lugar, arranjo um espaço para colocar a mala. Sento-me. E sinto os nós no estômago a tornarem-se lassos.

“O mais difícil já passou”. “Mas porque raio é sempre tão difícil, cada vez mais difícil?”
Apetece-me escrever-te, a ti e a mim, a colocar-nos esta questão. “Mas para quê? Não é preciso, isto diz tudo”, digo a mim mesmo, com a velha lista de compras na mão.

“Morangos, Natas, Seven Up, Champanhe, Batatas, Ovos, Iogurte grego, Azeitonas”

Repito a lista. Está aqui tudo, afinal. Pouco há de tão palpável para definir nós-dois, a molécula densa que dói na separação. De pouco valem mais palavras. Nós somos, tão simplesmente, essa lista de compras esquecida no bolso de um casaco. Ou qualquer outro detalhe que contenha tanto em tão pouco.

Um Feliz Natal para ti, 
para nós, 
para o nosso Gui.

segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Por Mundos Divergentes e Lisboa no ano 2000

A antologia "Por Mundos Divergentes" foi apresentada neste último (o 9º) Fórum Fantástico:


Também neste Fórum, o livro "Lisboa no ano 2000", onde participei igualmente com um conto, foi distinguido pelo público como a melhor obra de literatura fantástica portuguesa relativamente ao ano que passou:

Longe do Sprawl

Verifiquei que não me servia realmente para nada. Por isso cancelei a minha área de facebook. Um passo atrás, de volta à caverna, para longe das luzes da comunidade digital.

sábado, 11 de outubro de 2014

Forum Fantástico


Está aí a chegar o Forum Fantástico. No primeiro dia do evento, 14 de Novembro, haverá lugar à apresentação da antologia "Por mundos divergentes", onde figura o meu conto "Arrábida8".

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

O lado bom deste super-ego enorme

é à noite termos sonhos maravilhosos.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Antologia "Por mundos divergentes" já está à venda



Autores: Ana C. Nunes, Pedro G.P. Martins, Nuno Almeida, Ricardo Dias e Sara Farinha

Sinopse:
Num futuro por vezes próximo, por vezes distante, Portugal sucumbe dos mais variados estados ditatoriais. Aquele que pensa é um inimigo do Estado. Um inimigo da pátria que tem de ter cuidado… e os que não têm cura, devem ser sacrificados pelo bem maior. Por mundos divergentes conta com cinco contos distópicos escritos por Ana C. Nunes, Nuno Almeida, Pedro G.P. Martins, Ricardo Dias e Sara Farinha.
Disponível em: Versão em papel
162 páginas
Preço da versão em papel: 10,00 euros
Já pode ser adquirido por compra online aqui